07/12/2016
Gazeta do Povo
O Brasil contra o roubo do dinheiro público
Foto – Crédito: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
As mudanças nas Dez Medidas Contra a Corrupção têm a clara intenção de parar qualquer ação contra parlamentares. Uma tentativa nítida de autoblindagem
Ricardo Prado Pires de Campos
[07/12/2016]
Neste domingo, vimos o brasileiro novamente nas ruas, vestido de amarelo, lutando por seu país, buscando influir nos destinos da nação, manifestando apoio à Operação Lava Jato e mostrando seu descontentamento com o parlamento.
A rejeição das Dez Medidas Contra a Corrupção pela Câmara de Deputados, na semana passada, e a completa desfiguração da proposta, seguida da tentativa de instituir punição para juízes e membros do Ministério Público, foi comemorada pela maioria dos deputados, mas rechaçada pela população. Igualmente, a tentativa de alguns membros do Senado de solapar qualquer discussão acerca do tema, aprovando um pedido de urgência para impedir a reação da sociedade, não pegou bem. Queimou ainda mais a já abalada credibilidade das instituições parlamentares.
Quem está abusando da autoridade: quem denuncia os desvios ou quem se locupleta com o dinheiro da população?
O projeto de lei que visa punir juízes, promotores e procuradores já usou o termo “crime de responsabilidade” e, agora, fala em “abuso de autoridade”. O problema é que o projeto não trata de abusos de autoridade contra a população, e sim de “crimes” contra políticos. Vejamos alguns exemplos.
Um dos incisos do projeto diz que constitui crime “atuar, no exercício de sua jurisdição” ou “atribuição”, “com motivação político-partidária”. Toda vez que um político é investigado, processado ou condenado, diz que a motivação foi político-partidária. Sempre e sempre. É a forma de se defender, de se apresentar como vítima do sistema, vítima de um complô. Transformar esse inciso em lei consiste em transformar qualquer processo ou investigação contra um político em crime. Promotores, procuradores e juízes sempre estarão praticando abuso de autoridade, toda vez que instaurarem um processo contra alguém dotado de cargo ou função política.
É evidente o despropósito! Esse artigo tem a clara intenção de parar qualquer ação contra os parlamentares. Uma tentativa nítida de autoblindagem. Eles não querem ser incomodados, principalmente por ameaça de prisão em razão do desvio de dinheiro público. É evidente o absurdo.
Mas não é só. Há uma tentativa de mordaça sobre os membros da Justiça, presente nos incisos IX e XII, visando impedi-los de “expressar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente”. Ou seja, querem calar o Judiciário e o Ministério Público exatamente no momento em que essas instituições vieram a público denunciar o bilionário desvio de recursos públicos promovido por centenas de políticos associados a um número significativo de empresas.
Quem está abusando da autoridade: quem denuncia os desvios ou quem se locupleta com o dinheiro da população? Quem está errado: quem rouba ou quem avisa?
Há muito jogo de cena, buscando torcer a realidade. Mas os tempos são outros. A população tem, atualmente, inúmeros mecanismos de fiscalização; a transparência está fazendo ruir as máscaras de muitos políticos. Os nomes estão registrados e serão relembrados nas eleições. A memória digital é poderosíssima. Mas a população não quer apenas votar; quer influir nos destinos da nação, e tem todo o direito de fazê-lo, pois “todo poder emana do povo”. E, se aqueles que deveriam fazê-lo em seu nome não agem corretamente, devem ser substituídos, e sem demora.
Ricardo Prado Pires de Campos, mestre em Direito e procurador de Justiça, é 2º vice-presidente do Movimento do Ministério Público Democrático (MPD).
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