Por Paulo José de Palma e Fernanda Narezi Pimentel Rosa
Preconiza o artigo 11 do Decreto Presidencial 8.940, de 22 de dezembro de 2016: “As penas correspondentes a infrações diversas devem somar-se, para efeito de declaração do indulto até 25 de dezembro de 2016”.
É certo que nos decretos natalinos anteriores já constava essa regra (vide artigo 8º dos decretos presidenciais 8.615/2015, 8.380/14 e 8.172/2013, dentre outros). Porém, em tais decretos, o presidente da República não trazia requisito temporal diferenciado para crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa e delitos praticados sem tais circunstâncias, razão pela qual a norma em questão não trazia maiores implicações.
Ocorre que o decreto presidencial atinente ao ano de 2016 separou os crimes, dispensando-lhes tratamento diferenciado, conforme as circunstâncias da execução.
O artigo 3º trata dos crimes cometidos sem grave ameaça ou violência à pessoa, estabelecendo, nos incisos I e II, que o indulto será concedido quando a pena privativa de liberdade não for superior a 12 anos, caso cumpridos 1/4 da pena, se não reincidente e, de outro lado, 1/3, se reincidente; ou 1/6 da pena se não reincidente, e 1/4 se reincidente, nas hipóteses especiais contempladas no artigo 1º.
Já o artigo 5º do mesmo diploma cuida dos crimes praticados com grave ameaça ou violência à pessoa, desde que cumpridos os requisitos exigidos em cada inciso, 1) quando a pena privativa de liberdade não for superior a quatro anos; 2) quando a pena privativa de liberdade for superior a quatro e inferior a oito anos.
Assim, para os crimes sem grave ameaça ou violência à pessoa, o limite máximo da pena para cabimento do indulto é de 12 anos; enquanto os crimes com grave ameaça ou violência à pessoa poderão ser indultados somente se a pena não ultrapassar oito anos, ressalvadas, é claro, as penas impostas para os crimes previstos no artigo 2º (hediondos e equiparados).
Pois bem.
Se na análise do cabimento do benefício nos deparamos com sentenciado condenado por vários crimes, todos eles executados sem violência ou grave ameaça à pessoa, não há maiores dificuldades na aplicação do artigo 11. Basta somar as penas, verificar se não superam 12 anos e se o lapso temporal de cumprimento exigido foi satisfeito.
De igual modo, se estivermos diante de sentenciado que cumpre pena por delitos levados a cabo com violência ou grave ameaça à pessoa, nenhum embaraço se verificará na observância do artigo 11.
As implicações, no entanto, surgem quando o executado ostenta condenação por crimes cometidos com e sem violência ou grave ameaça à pessoa.
Ao que nos parece, é necessário distinguir duas situações.
A primeira delas é de um condenado que amargou uma pena, por exemplo, de 6 anos de reclusão por roubo e de 4 anos por falsidade documental, totalizando 10 anos.
Nesse caso, na esteira do disposto no artigo 11, entendemos que o indulto da pena de nenhum dos dois crimes é cabível, pois a somatória ultrapassa 8 anos, e um dos delitos foi cometido com violência ou grave ameaça à pessoa.
Não podemos cindir a execução unificada para análise individual dos requisitos de cada crime para o indulto, pois estaríamos negando vigência aos termos do artigo 111 da LEP, bem como ao artigo 11 do Decreto em questão.
Outra, contudo, é a situação na hipótese na qual a somatória das penas não supera 8 anos.
Se ao sentenciado, por exemplo, tiver sido imposta uma reprimenda de 5 anos e 4 meses pelo crime de roubo e de 1 ano pelo delito de estelionato, embora um dos crimes tenha sido praticado com violência e grave ameaça à pessoa, como a somatória das penas é inferior 8 anos, caso presentes os requisitos, não nos parece haver óbice ao deferimento do indulto, porém, unicamente da pena que está sendo cumprida.
Tal entendimento encontra esteio no artigo 76 do Código Penal, o qual regra que a pena do crime mais grave deverá ser executada em primeiro lugar.
Desse modo, caso o sentenciado esteja cumprindo a pena do crime de roubo, deve ser analisada a presença dos requisitos exigidos pelo decreto somente com relação a tal reprimenda, e o indulto sobre ela recairá, se presentes os requisitos.
Uma vez indultada a pena, o sentenciado então iniciará o cumprimento da reprimenda do segundo crime, cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa.
Importante aqui lembrar que, no tocante ao concurso de crime comum com delito hediondo ou equiparado, o parágrafo único do artigo 11 foi claro no sentido de somente admitir o indulto da pena do crime comum após o sentenciado terminar de cumprir a reprimenda do delito impeditivo.
Ou seja, está explícito que o indulto somente é cabível quanto a pena que está sendo cumprida, desde que resgatada a reprimenda do crime hediondo ou equiparado.
Com efeito, em que pese o teor do artigo 11 do decreto natalino em questão, diante das disposições constantes da LEP (artigo 111) e do Código Penal (artigo 76), no caso de condenações decorrentes de crimes praticados com grave ameaça ou violência à pessoa e de delitos cometidos sem tais circunstâncias, caso a somatória das penas não supere 8 anos, não vislumbramos interpretação diversa da cisão das reprimendas, analisando o cabimento do indulto somente da pena que está sendo cumprida, afinal: “Dura lex, sed lex”.
Fernanda Narezi Pimentel Rosa é promotora de Justiça, assessora do Núcleo de Execuções Criminais do CAOCrim e integrante do MP Democrático.
Paulo José de Palma é promotor de Justiça, assessor do Núcleo de Execuções Criminais do CAOCrim e integrante do MP Democrático.
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Imagem: Arquivo/Pixabay