CARTA DE MEDIDAS

Mudanças nas leis podem combater enraizamento no poder e a corrupção

15 de abril de 2015, 19h01

Por Roberto Livianu

Na tarde desta quarta-feira (15/4), os líderes dos movimentos de 15 de março e 12 de abril entregaram em Brasília a Carta do Povo Brasileiro ao Congresso Nacional e a outras autoridades federais, com reivindicações da sociedade civil. Fui chamado por Rogério Chequer e outras pessoas a contribuir com ideias concretas a partir do que foi reivindicado nas ruas sobre controle da corrupção e do enraizamento no poder. A maior parte delas foi aproveitada na carta.

Abaixo, explico algumas das iniciativas sugeridas:

Redução da máquina pública, com redução do número de cargos de confiança.
A Constituição Federal de 1988 impõe a exigência da realização do concurso público como instrumento garantidor da meritocracia para prover como regra os cargos públicos no Brasil.

No Chile, padrão sul-americano de controle da corrupção (18º lugar no IPC da Transparência Internacional de 2014 — o Brasil é o 73º), periodicamente a máquina sofre enxugamentos para diminuir ao máximo o número de cargos de confiança.

No Brasil, o movimento é inverso e a máquina pública em todos os níveis é inchada, sendo frequente a prática do nepotismo, grave forma de abuso do poder de contratar — o mais recente e escandaloso caso é o de Roraima, onde Suely Campos, que substituiu no pleito na última hora o esposo ficha-suja Neudo Campos, na primeira semana de governo, nomeou 19 parentes, ao custo de mais de R$ 400 mil por mês aos pobres cofres públicos daquele estado. É essencial que se modifique este quadro, com esforço dirigido à austeridade, especialmente neste grave momento de crise econômica.

Intervenção obrigatória do Ministério Público nos acordos de leniência previstos na Lei Anticorrupção. A Lei 12.846/2013 foi aprovada para punir a corrupção empresarial, não para salvar empresas em dificuldade. Seguiu-se tendência internacional a partir dos encaminhamentos contidos nos Tratados da CDE e de Mérida.

Para que se atinja este objetivo, não tem cabimento algum concentrar o poder de celebração de tais acordos nas mãos dos órgãos de controle interno federal, estadual e municipal. Há conflito de interesses. Estes órgãos são do Estado e não pode ser selado qualquer pacto com empresas corruptas sem a fiscalização do MP, que foi incumbido pela Constituição da defesa independente do patrimônio público.

A Controladoria Geral da União e demais órgãos não conhecem o exato alcance do que o MP está investigando, inclusive fora do Brasil, sendo desaconselhável qualquer acordo sem ser ouvido o órgão.

Além disso, não é plausível retirar do Poder Judiciário e transferir para o governo a apreciação sobre restrições a acesso a linhas de financiamento públicas, declarações de inidoneidade de empresas e dosagem de multas. Sem esquecer que em muitos dos mais de 5.500 municípios do Brasil não existem órgãos de controle e, em certos lugares, até faxineiros exercem a função de controladores. Assim, impõe-se a provação do PL 105 do Senador Ferraço, que exige a homologações destes acordos pelo MP.

Fim da reeleição para Executivo e Legislativo com um mandato de cinco anos.
A forma republicana tem como essência a promoção da alternância no poder por eleições. As reeleições custam caríssimo para o país e grande parte das energias do mandato parlamentar são empenhadas muitas vezes no projeto de reeleição.

Hoje existe o limite a duas consecutivas para o Executivo e não há limite de reeleição para o Poder Legislativo. Há parlamentares no mesmo cargo há 40 anos! Muito mais saudável e efetivamente republicano que se limite o tempo de permanência no poder, visando impedir o enraizamento, nocivo à sociedade, sugerindo-se o tempo de mandato de cinco anos para todos os cargos eletivos no Executivo e Legislativo sem possibilidade de reeleição.

Independência para o MP, respeitando os resultados das eleições diretas pelos Promotores com voto uninominal, sem listas tríplices com sabatina pelo Legislativo.

A Constituição da República incumbiu o Ministério Público de concretizar a cidadania, defendendo o patrimônio público, urbanístico, ambiental, cultural, histórico, a infância e juventude, os idosos, indígenas, pessoas com deficiência entre tantos interesses sociais fundamentais.

Mais do que isso, o MP foi incumbido de defender a ordem jurídica e o regime democrático. Neste contexto, é fundamental aperfeiçoar sua independência, modificando a forma de escolha dos Procuradores-Gerais, visando a desconcentração do poder gerada pelas listas tríplices que permitem discricionária escolha pelo chefe do Executivo.

Mais adequado se mostra respeitar o voto dos membros dos MPs, em eleições com voto direto e uninominal com posterior sabatina desconcentradora do poder pelo Poder Legislativo, a nível estadual bem como a nível federal, no qual hoje sequer há a previsão de eleições, mas apenas de consulta informal e aprovação pelo Senado após escolha livre do Presidente.

Defendo MP independente e sob controle, com o Conselho Nacional do Ministério Público forte, estruturado e, contando com a participação da base da sociedade civil nas escolhas feitas pela Câmara e Senado bem como com a aprovação do projeto de lei de regulamentação da investigação criminal, que estipule os parâmetros e papéis do MP e da Polícia para, unidos, cumprirem suas missões.

Mudança do método de escolha dos ministros do Supremo Tribunal Federal e outros, instituindo mandatos com quarentena.

Em países com a Alemanha, o mandato para a Suprema Corte é excelente instrumento de democracia e alternância no poder, não parecendo justificável que escolha caracterizada por ato de poder excessivamente concentrado do chefe do Executivo federal tenha duração vitalícia.

É saudável discutir a ideia de instituir mandatos de dez anos para ministros do STF, Superior Tribunal de Justiça; Superior Tribunal Militar; e tribunais de contas da União, dos estados e dos municípios, com instituição de quarentenas que protejam a sociedade do possível e indesejável tráfico de influência pós-mandato.

Reforma política com a revisão do financiamento de campanhas, eliminando doações de empresas.
É notório que muitos dos casos de corrupção conhecidos no país se originam de relações constituídas à época das campanhas eleitorais, onde há farta irrigação de recursos oriundos de empresas, que muitas vezes são as beneficiadas em contratações feitas pelos eleitos que apoiaram. São naturais e óbvios os entraves fiscalizatórios para o contratante em relação ao cumprimento das obrigações do contratado que o ajudou a conquistar o poder.

As regras eleitorais precisam coibir os abusos de poder econômico e conferir equilíbrio às disputas, permitindo que o melhor projeto para o bem comum, mesmo que sem recursos, seja o escolhido.

Além disso, é notória a grave crise de representatividade política, sendo imperioso que se discuta o voto distrital para aproximar representante e representado, melhorando a qualidade de nossa democracia representativa, entre outros aspectos envolvidos no tema reforma política.

O pacote anticorrupção apresentado pela Procuradoria Geral da República também traz algumas importantes proposições visando a eficiência no combate jurídico à corrupção, como a criminalização do caixa 2 e do enriquecimento ilícito. Proponho a priorização drástica processual dos julgamentos envolvendo ofensas ao patrimônio público.

Acrescento, por fim, visando a eficiência punitiva da corrupção, a ideia de instituir a pena de confisco parcial ou integral de patrimônio para violadores do patrimônio público, já que é sabido que a pena patrimonial é tendência internacional testada e aprovada, sendo interessante que a punição guarde proporção com o patrimônio do violador e não com o dano, para que não possa chegar à conclusão que vale a pena correr o risco e cumprir a pena.

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