Instituto Não Aceito Corrupção, Movimento do Ministério Público Democrático, Movimento VemPraRua, Associação Contas Abertas, Movimento Livres e Transparência Brasil repudiam inquérito da censura do Supremo

Luiz Vassallo

16 de abril de 2019 |

Instituto Não Aceito Corrupção, Movimento do Ministério Público Democrático, Movimento VemPraRua, Associação Contas Abertas, Movimento Livres e Transparência Brasil afirmaram, por meio de nota, nesta terça, 16, inquérito aberto de ofício pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, e relatado pelo ministro Alexandre de Moraes, sob o pretexto de combater ‘fake news’, e que mandou excluir matéria da revista Crusoé e de O Antagonista. A reportagem ‘Amigo amigo do meu pai’ cita e-mails de Marcelo Odebrecht que mencionam o presidente da Corte. A publicação foi multada em R$ 100 mil.

Nesta terça, 16, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, informou à Corte que promoveu o arquivamento da investigação. Já o ministro Alexandre de Moraes decidiu manter o inquérito.

Segundo as entidades, ‘na contramão desta tendência internacional, no último dia 14 de março, o Presidente do Supremo Tribunal Federal editou a Portaria GP 69 por força da qual foi instaurado inquérito de motivações e objeto genérico para apurar notícias fraudulentas (fake news), denunciações caluniosas, ameaças e infrações revestidas de animus caluniandi, diffamandi ou injuriandi atentatórias à honorabilidade e segurança do STF’.

As entidades dizem que ‘a leitura da decisão preocupa porque não procurou aquele que se diz vítima pelo amparo da Justiça como qualquer mortal, valendo-se de seu poder para obter sumária decisão em seu favor, proferida por magistrado que ele escolheu para ser Relator, colocando em xeque o sistema de duplo grau de jurisdição bem como o princípio do juiz natural’.

“O despacho do Ministro Relator, que padece de fundamentação, classifica a matéria, baseada em documento disponível na internet, como fake news, sem que exista na legislação vigente qualquer espécie de parâmetro preciso de definição do respectivo conceito além de desconsiderar o fato de ter silenciado o Ministro Presidente ao ser procurado pela reportagem dos veículos em foco antes da publicação, para externar sua versão sobre os fatos”, sustentam.

“Com base nos poderes nos quais foi investido por esta Portaria (sem distribuição nem sorteio), que mescla os papeis de acusadores e julgadores, a partir de provocação do Presidente do STF, o Ministro Relator determinou ontem a retirada do ar de reportagem incriminadora relacionada a atos de corrupção, publicada em desfavor do Presidente do STF, por suposto abuso jornalístico não definido nem especificado, que teria sido cometido pelos portais Crusoé e O Antagonista”, afirma.

As entidades afirmam entender a ‘tomada como desrespeitosa aos direitos constitucionais e universais à liberdade de expressão e de acesso à informação, no bojo de procedimento investigatório vago e genérico, sem objeto nem suspeitos precisos, que pode ser interpretado razoavelmente como uma ameaça geral ou uma gigante espada de Dâmocles apontada genericamente, algo não aceitável num sistema democrático’.

“Todos têm direito à informação bem como a selecionar, interpretar e julgar fatos sem censuras ou bloqueios, afigurando-se atitude que assume ares de intimidação judicial a determinação da retirada do ar de reportagem sumariamente desqualificada pelo atingido pelo fato de desagradá-lo. Se o jornalista publica algo indevido, que o prejudicado o processe, que se respeite o devido processo legal e, ao final, se for o caso, que o faltoso seja responsabilizado. Defendemos liberdade de imprensa, mas jamais apoiaremos irresponsabilidade de opinião”, escrevem.

“A opacidade é aliada da corrupção, afigurando-se inaceitável decisão de Ministro do STF que tisna a imagem de nossa democracia no plano internacional neste momento em que pleiteamos assento junto à OCDE, pelo que o conclamamos o STF a reconsiderar o ato de censura determinado, restabelecendo a prevalência dos ditames da liberdade de expressão e acesso à informação”, concluem.

LEIA A NOTA

Nota Pública – Autoritarismo togado
Entidades repudiam censura a veículos de imprensa.

A Constituição Federal de 1988 consagrou como dois de seus pilares fundamentais o direito à liberdade de expressão e o direito de acesso à informação, elementos fundamentais para a existência plena do Estado Democrático de Direito, o que se reforçou diante da assunção de responsabilidades do Brasil no plano internacional ao sermos signatários do Pacto de San José da Costa Rica em 1992 e ao integrarmos como membro-fundador a OGP em 2011.

Na contramão desta tendência internacional, no último dia 14 de março, o Presidente do Supremo Tribunal Federal editou a Portaria GP 69 por força da qual foi instaurado inquérito de motivações e objeto genérico para apurar notícias fraudulentas (fake news), denunciações caluniosas, ameaças e infrações revestidas de animus caluniandi, diffamandi ou injuriandi atentatórias à honorabilidade e segurança do STF.

Com base nos poderes nos quais foi investido por esta Portaria (sem distribuição nem sorteio), que mescla os papeis de acusadores e julgadores, a partir de provocação do Presidente do STF, o Ministro Relator determinou ontem a retirada do ar de reportagem incriminadora relacionada a atos de corrupção, publicada em desfavor do Presidente do STF, por suposto abuso jornalístico não definido nem especificado, que teria sido cometido pelos portais Crusoé e O Antagonista.

A Procuradoria Geral da República, na qualidade de titular da ação penal pública acaba de promover o arquivamento do inquérito em foco, além de informar ao Ministro Relator que as medidas autorizadas, inclusive de censura aos veículos já mencionadas não foram requeridas nem acompanhadas pelo Ministério Público.

A leitura da decisão preocupa porque não procurou aquele que se diz vítima pelo amparo da Justiça como qualquer mortal, valendo-se de seu poder para obter sumária decisão em seu favor, proferida por magistrado que ele escolheu para ser Relator, colocando em xeque o sistema de duplo grau de jurisdição bem como o princípio do juiz natural.

O despacho do Ministro Relator, que padece de fundamentação, classifica a matéria, baseada em documento disponível na internet, como fake news, sem que exista na legislação vigente qualquer espécie de parâmetro preciso de definição do respectivo conceito além de desconsiderar o fato de ter silenciado o Ministro Presidente ao ser procurado pela reportagem dos veículos em foco antes da publicação, para externar sua versão sobre os fatos.

Interpretamos a decisão tomada como desrespeitosa aos direitos constitucionais e universais à liberdade de expressão e de acesso à informação, no bojo de procedimento investigatório vago e genérico, sem objeto nem suspeitos precisos, que pode ser interpretado razoavelmente como uma ameaça geral ou uma gigante espada de Dâmocles apontada genericamente, algo não aceitável num sistema democrático.

Todos têm direito à informação bem como a selecionar, interpretar e julgar fatos sem censuras ou bloqueios, afigurando-se atitude que assume ares de intimidação judicial a determinação da retirada do ar de reportagem sumariamente desqualificada pelo atingido pelo fato de desagradá-lo. Se o jornalista publica algo indevido, que o prejudicado o processe, que se respeite o devido processo legal e, ao final, se for o caso, que o faltoso seja responsabilizado. Defendemos liberdade de imprensa, mas jamais apoiaremos irresponsabilidade de opinião.

A opacidade é aliada da corrupção, afigurando-se inaceitável decisão de Ministro do STF que tisna a imagem de nossa democracia no plano internacional neste momento em que pleiteamos assento junto à OCDE, pelo que o conclamamos o STF a reconsiderar o ato de censura determinado, restabelecendo a prevalência dos ditames da liberdade de expressão e acesso à informação.

Instituto Não Aceito Corrupção
Movimento do Ministério Público Democrático
Movimento VemPraRua
Associação Contas Abertas
Movimento Livres
Transparência Brasil

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