A entrevistada do mês é a Dra. Tereza Exner, procuradora de Justiça e associada ao MPD. Recentemente, ela assumiu o cargo de Corregedora-Geral do Ministério Público do Estado de São Paulo, e agora, foi eleita Presidente do Conselho Nacional dos Corregedores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União. É a primeira mulher na história da instituição paulista a assumir a chefia da Corregedoria, órgão responsável pela fiscalização dos membros do Ministério Público.

“Busco com minha atuação destacar a necessidade de implementação de um novo modelo cultural no qual homens e mulheres estabeleçam uma forma de integração cada vez mais respeitosa e igualitária, de modo que harmonicamente possamos superar as simplistas oposições binárias que tanto nos limitam a todos e a todas”.

Em entrevista para a newsletter semanal do MPD, a Dra. Tereza Exner fala sobre a eleição ao novo cargo, os desafios de ser mulher em órgãos públicos e a importância do MP e do MPD para a sociedade. 

1) Você foi eleita como Presidente do Conselho Nacional dos Corregedores-Gerais do Ministério Público e será a primeira mulher na história da instituição a assumir o cargo. Qual é o significado desse feito pra você?

Assumir a Presidência do Conselho Nacional dos Corregedores foi para mim um momento de muita felicidade. O apoio uníssono de meus pares, a par da elevada honra, aumenta a minha responsabilidade na condução desse respeitável órgão, representativo que é de todos os Corregedores-Gerais que integram o Ministério Público dos Estados e da União.

Importante destacar que anteriormente a Presidência do nosso Conselho já havia sido exercida por duas colegas, a dra. Jacqueline Rosenfeld, Corregedora-Geral do Rio Grande do Sul e a dra. Maria Creuza Brito Figueiredo, Corregedora-Geral do Sergipe.

Sou, portanto, a terceira mulher a exercer essa honrosa função. Na linha de meus antecessores, sigo enfatizando a importância de nos valermos desse espaço de discussão para fortalecermos nossa união e incrementarmos nossa troca de experiências, para debatermos as diversas realidades de cada Ministério Público, disseminando as boas práticas, construindo consensos e integrando-nos cada vez mais, sempre  com foco em nossa independência institucional e respeito aos nossos valores e tradições.

A palavra dos Corregedores-Gerais, incumbidos que são de orientar e fiscalizar os membros da instituição, deve ser cada vez mais ouvida. Afinal, no desenvolver das atividades correcionais e  visitas de inspeção, a Corregedoria tem acesso às reais condições e volume de trabalho a que está submetido cada um dos integrantes do nosso Ministério Público, podendo, assim, levar ao conhecimento dos demais órgãos de Administração Superior informações qualificadas acerca de  eventuais necessidades ou carências que, se sanadas, irão implicar em melhoria dos trabalhos.

2) Quais os desafios de ser mulher em uma organização como o Ministério Público?

Em evento recente, do qual participei, disse que a despeito de estarmos em pleno século XXI, um dos maiores desafios ainda hoje é simplesmente ser mulher. E falo de uma posição bastante confortável. Pois sou branca, vim de uma família que me deu toda a estrutura educacional humana e formal, valores éticos, acesso a boas escolas e cultura. Tenho um marido que me apoia, duas filhas parceiras. A despeito de tantos homens e mesmo tantas mulheres não reconhecerem a importância da luta pela equidade de gêneros, é inegável que a assimetria cultural de tratamento entre gêneros nos cobra mais do que aos homens. Como Corregedora-Geral do Ministério Público de São Paulo, e agora também Presidente do Conselho Nacional dos Corregedores-Gerais, busco com minha atuação destacar a necessidade de implementação de um novo modelo cultural no qual homens e mulheres estabeleçam uma forma de integração cada vez mais respeitosa e igualitária, de modo que harmonicamente possamos superar as simplistas oposições binárias que tanto nos limitam a todos e a todas.

3) Quais pontos da sua carreira que você destacaria e acredita que vão contribuir para sua atuação no novo cargo?

Como já ponderado acima, creio que a busca constante pelo diálogo interno e interinstitucional, a capacidade de ouvir, o respeito pelos colegas Promotores e Procuradores de Justiça. São atributos que reputo bastante valiosos nesta dupla função orientadora que ora desempenho, ajudando na construção de um Ministério Público cada vez mais integrado, formado por membros conscientes de suas graves atribuições constitucionais, que devem ser usadas para a promoção do bem público e da melhoria dos indicadores sociais.

4) Quanto ao cargo de procuradora, quais são os maiores desafios e a maior satisfação dessa profissão?

Atuo desde 2009 na Procuradoria de Justiça Criminal. Reputo um trabalho de elevada importância que sempre busquei desempenhar com disposição e comprometimento. Entendo que a verdadeira “ratio” a justificar a submissão dos autos ao membro ministerial de 2ª. Instância, é  permitir-lhe que se inteire com clareza da ação penal, garantindo-se, desse modo, a paridade de armas. Tendo tempo para estudar e conhecer todas as nuances do processo, o Procurador de Justiça poderá elaborar parecer adequado, completo, que norteará o colega Procurador de Justiça que fará a sustentação oral perante a Câmara de Julgamento, atuação essa das mais relevantes. Atente-se que o Procurador de Justiça que elabora o parecer, no mais das vezes é diverso daquele que fará a sustentação oral. Daí a importância do parecer prévio, sobretudo em tempos atuais em que numa mesma sessão de julgamento há mais de vinte (20), algumas vezes até trinta (30) processos, para sustentação oral.

5) Quando e por que você decidiu se associar ao MPD?

Associei-me ao MPD logo nos seus primórdios. Não me lembro exatamente a data. E o fiz por acreditar na importância de espaços de debates democráticos, plurais, para trocas de ideias e consolidação de avanços civilizatórios.

6) Qual a importância de um movimento como o Ministério Público Democrático?

Um espaço de construção plural e democrático é importante por si só. Mas lembro da campanha organizada pelo MPD nas últimas eleições, como um exemplo bastante concreto de sua firme atuação em prol da cidadania.

7) Quais devem ser os objetivos atuais do Ministério Público?

Como dito acima, penso que o Ministério Público desta geração deve se preocupar em formar seus membros para uma visão cada vez mais atenta às demandas sociais e ao seu papel de relevância constitucional na melhoria das condições de vida dos cidadãos, nossos reais parceiros, notadamente em tempos onde a coisa pública e a causa pública são tidas, infelizmente,  como de menor importância.

8) Quais são os pontos fortes da Instituição e onde precisa melhorar?

O ponto forte de nossa Instituição é o seu valioso material humano. Vale dizer nossos Promotores, Promotoras,  Procuradores e Procuradoras de Justiça, homens e mulheres que trabalham muito e muito bem. Evidentemente temos problemas pontuais, como toda e qualquer carreira ou instituição. Mas como Corregedora do Ministério Público de São Paulo, posso afirmar que nossa população está muito bem servida. Também insta frisar a qualidade de nossos servidores, profissionais dos mais dedicados. Precisamos nos valer de toda essa capilaridade e dessa qualidade humana incrível para realizarmos mais atividades coordenadas e integradas entre as nossas diversas áreas de atuação, com maior proximidade das redes de apoio, da população e das demais instituições.

9) Como a Corregedoria-Geral pode contribuir para isso?

A Corregedoria vem incentivando o diálogo cada vez maior e mais transparente com os integrantes da nossa Instituição. Neste começo de ano, por exemplo, já visitamos 14 das 16 áreas regionais, para falar sobre questões mais prementes, como o comportamento nas redes sociais, sobretudo em período pré-eleitoral,  e as novas leis de abuso de autoridade e pacote anti-crime. Viemos, também, incentivando um projeto, ainda em fase inicial, que denominamos “Corregedoria Cidadã”, de forma a viabilizar uma atuação conjunta e integrada entre colegas que atuam na área da Infância e da Juventude, Saúde, Pessoa com Deficiência, Criminal, com objetivo de combater a abjeta prática de estupro contra vulneráveis. Enfim, incentivar o trabalho em grupo e integrado, assim como a discussão dos valores e da ética institucional são atitudes que entendo fundamentais para o aprimoramento de nosso perfil institucional.

10) Se você pudesse dar um conselho para um jovem formado em direito e que pretende ingressar no Ministério Público, qual seria?

Se vier, venha com paixão e vontade de trabalhar muito em prol da comunidade, sobretudo a mais carente. A esse respeito que reflita sobre a frase do extraordinário escritor Graciliano Ramos: “Comovo-me em excesso, por natureza e por ofício. Acho medonho alguém viver sem paixões”.