Mario de Magalhães Papaterra Limongi e Ministério Público Democrático, 18.09.2024 15:19
No próximo dia 6, o eleitor brasileiro volta às urnas para escolher os seus prefeitos e vereadores. Pesquisas indicam que nos maiores municípios a segurança pública é uma das principais preocupações dos munícipes/eleitores.
Diante dessa constatação, todos os candidatos às principais prefeituras, seguindo orientação dos marqueteiros, dedicam parte considerável de seus discursos com promessas de ações de combate à criminalidade.
A rigor, o tema segurança pública não deveria figurar como tema relevante de campanha.
Isso porque, como é sabido, não cabe ao prefeito municipal definir as prioridades nesta área, tarefa esta de competência primordial dos governadores de Estado, responsáveis, entre outras funções, pela escolha dos chefes de polícias (comandante geral da Polícia Militar, delegado geral de polícia e superintendente da Polícia Técnica e Científica).
Sucede, no entanto, que, já há algum tempo, candidatos a prefeito, demagogicamente, chamaram ao debate a questão da segurança pública.
Evidente que uma boa ação de zeladoria, com a criação de espaços públicos mais limpos, uma política adequada para facilitar a mobilidade urbana com investimento maciço em transporte público, além da oferta de opções de lazer e cultura, teriam impacto na diminuição da violência, pois tais medidas são fatores que modificam comportamentos.
Os candidatos, no entanto, ao invés de honestamente se posicionarem como atores secundários da questão, assumiram o problema, chamando para eles tarefas que, em verdade, não lhes compete.
Em um primeiro momento, foi fácil cumprir a promessa eleitoral com a criação das guardas municipais, nos termos do artigo 144, § 8º, da Constituição Federal:
“Os municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei”.
Ora, basta uma simples leitura do dispositivo constitucional que autoriza a criação das guardas municipais para se concluir que, mesmo com sua criação, os prefeitos têm pouca interferência na política de segurança pública.
A norma constitucional impõe um claro limite à atuação das guardas municipais: “proteção de seus bens, serviços e instalações”.
Assim, qualquer conduta dos guardas municipais que não vise à proteção dos bens, serviços e instalações do município esbarra no limite imposto pela Constituição Federal que, claramente, não lhes atribuiu poder de polícia, restritos às polícias civil e militar estaduais e federais.
É certo que, gradativamente, as guardas municipais, com a conivência inexplicável das polícias estaduais, passaram a praticar condutas de prevenção e repressão.
Não é incomum a realização de comandos em operações conjuntas com a participação de policiais militares e guardas municipais, além de condutas típicas de investigação, tais como a abordagens a “suspeitos”, a exigência de identificação etc.
Muitos julgados, em especial do STJ, reconheceram a ilicitude da prova originada de atividades das guardas municipais quando exerciam funções não permitidas pela Constituição Federal.
Outros julgados validavam a prova com o argumento de que “qualquer do povo” pode prender quem quer que esteja em flagrante delito.
A questão- limite da atuação das guardas municipais- passou a ser tema de frequentes divergências em nossos tribunais.
A matéria, como não poderia deixar de acontecer, chegou ao Supremo Tribunal Federal.
Em decisão recente, com o voto desempate do ministro Cristiano Zanin, a mais alta corte do país, revendo posicionamento do STJ, formou maioria para considerar que as guardas municipais executam atividade de segurança pública, validando prisão em flagrante delito decorrente de abordagem em razão de “atitudes suspeitas”.
Embora discutível a decisão, em face da clareza do dispositivo constitucional, o fato é que agora as guardas municipais podem ter uma participação mais destacada na prevenção e repressão de crimes.
Parece evidente que a tendência é de crescimento da importância das guardas municipais.
Tal circunstância exige maior cautela no recrutamento e treinamento dos componentes das guardas municipais e, mais que isso, impõe que sejam apresentadas propostas concretas sobre como deve agir a Guarda Municipal.
Recentes notícias dão conta do envolvimento de guardas municipais com organizações criminosas, o que revela, a toda evidência, deficiência no recrutamento e ausência de controle interno.
A propósito, os candidatos afirmam vagamente que não tolerarão abusos e desvios sem mencionar, no entanto, quais serão os mecanismos de controle.
Bem ou mal, as polícias estaduais dispõem de meios próprios de fiscalização (corregedorias e ouvidorias), além de se submeterem ao controle externo do Ministério Público e das Corregedorias Judiciárias.
É preciso, portanto, que os candidatos especifiquem o que pretendem de suas guardas municipais, quais serão suas atividades e como será possível o controle de seus eventuais excessos.
Nas capitais e em várias cidades as guardas municipais são uma realidade.
Passou o tempo de se definir quais as políticas públicas a serem desenvolvidas para uma atuação eficaz.
Com a palavra, os candidatos.
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