“Em recente julgado, o STJ usou o termo “despachante criminal” para aludir a um caso criminal em que membro do Ministério Público acusava uma pessoa de tráfico de entorpecentes consistente na posse de 1,54 gramas de cocaína (isso mesmo, um grama e cinquenta e quatro centigramas!) — e que por esse fato foi condenado em segunda instância a quase 7 (sete) anos de reclusão pelo maior tribunal do país. 

Apontava o STJ a inconsistência de uma atuação criminal burocrática de parte do MP, contrária a uma eficiência mínima da persecução penal, convertendo-se “em simples ‘despachantes criminais’, ocupados de pleitear meramente o emprego do rigor sistemático de dogmática jurídico- penal, ademais, de meros fiscais da aplicação sistemática e anódina da pena”. E perguntava o relator, em tom crítico: “É sustentável, no mundo atual — após uma frustrada guerra cinquentenária ao comércio de drogas — impor-se uma pena de quase 7 anos de reclusão, em regime inicial fechado, a alguém flagrado com 1,54 gramas de cocaína?” (julgado citado). 

Temo que a resposta requerida seja um pouco mais complexa. É que casos como esse não são pontuais, fazem parte da operatividade do sistema criminal. 

Em obra coletiva sobre julgados do maior Tribunal de Justiça do país, ilustres pesquisadores demonstraram que, à guisa de bloquear benefícios previstos na própria lei de drogas e endurecer a pena a pequenos traficantes, decisões judiciais se esmeravam em justificar maior reprovabilidade para casos de tráfico sob anódinos discursos, tais como: ‘o verdadeiro mal do século’; ‘que causa intranquilidade para população ordeira’; ‘que fere o equilíbrio social e desestabiliza a sociedade’; ‘delito nefasto, que deturpa a sociedade, destrói seres humanos e lares’ e quejandos”. 

Pedro Barbosa Pereira Neto, é procurador regional da República em São Paulo e associado do Movimento do Ministério Público Democrático, publicou na coluna MP e Democracia em O Estado de S. Paulo, no dia 31 de março, o artigo intitulado “O despachante criminal”.

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