“Com o advento da Constituição Federal de 1988 e a lenta edição de uma legislação voltada para a realização dos seus princípios e das suas determinações, teve início um ciclo histórico que permitiu vislumbrar uma crescente redução da impunidade reinante na área da criminalidade consistente na prática de delitos de corrupção, até então quase nunca incomodada para valer pelas nossas instituições de controle e fiscalização.

No decorrer desse processo, a nação acompanhou com um misto de perplexidade e indignação o desenrolar do famigerado caso do Mensalão, que resultou na condenação criminal e encarceramento de vários parlamentares, dirigentes políticos e empresários, principalmente por atos de corrupção e lavagem de dinheiro.

Esse julgamento projetou o Supremo Tribunal Federal como uma instituição cujo posicionamento doutrinário majoritário se achava em linha com o sentimento médio de justiça da sociedade brasileira. Pouco tempo depois, mais um gigantesco caso de corrupção sacudiu a nossa sociedade, a partir do conhecimento público de inúmeros episódios de malversação de recursos públicos que tiveram como palco a Petrobras, até então tida como a maior empresa brasileira e uma das maiores do mundo. Esse caso ficou conhecido como Petrolão.

Também desta feita, evidenciou-se que os prejuízos de bilhões de reais infligidos à Petrobras tiveram como responsáveis e beneficiários parlamentares, agentes públicos e dirigentes empresariais, inclusive de grandes empresas. Constituiu-se, então, a Operação Lava Jato, designação pela qual tornou-se conhecida a Força-Tarefa encarregada de investigar e esclarecer a maior parte dos delitos praticados no âmbito dos desmandos perpetrados na mencionada empresa.

Os processos criminais resultantes do profícuo trabalho desenvolvido por essa força-tarefa ensejaram inúmeras condenações criminais e muitos acordos de leniência – estes responsáveis pela devolução à Petrobras de mais de quatro bilhões de reais, de um total previsto que deverá se aproximar de vinte bilhões, com as devidas atualizações monetárias. Dentre os condenados, destacou-se a de um ex-presidente da república, cuja sentença se deu em primeira instância e foi confirmada por dois outros tribunais.

Entretanto, com mudanças no posicionamento jurídico de alguns ministros do Supremo Tribunal Federal, foram aí proferidas polêmicas decisões que, acolhendo uma visão doutrinária que prefere a forma ao conteúdo, anularam várias daquelas condenações criminais, todas elas por questiúnculas procedimentais de nenhuma relevância jurídica e não causadoras de nenhum prejuízo ao direito de defesa dos condenados, reinterpretando regras processuais que há décadas vinham sendo estritamente observadas e aplicadas pelo conjunto da nossa justiça criminal.”

Carlos Cardoso de Oliveira Júnior é procurador de Justiça aposentado do Ministério Público de São Paulo e membro da diretoria do MPD. Nesta semana, o autor publicou na coluna do MPD no jornal O Estado de S. Paulo, o artigo intitulado “O triunfo da impunidade”.

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