Proteção dos direitos fundamentais em tempos de crise

Nos últimos meses, o Brasil tem passado por debates acalorados sobre temas políticos. Em comum, a mesma questão se coloca: qual o país que desejamos, em contraposição àquele que temos? A insatisfação generalizada com os diversos casos de corrupção, assim como em relação ao aumento progressivo da violência urbana, convive com a sensação de impunidade. A população, por seu turno, parece não mais estar disposta a tolerar esse estado de coisas.

Nesse cenário, surgem e ressurgem ideias das mais variadas, como promessas de solução. No entanto, muitas discussões tem sido superficiais, com argumentos passionais, em meio à intolerância com as opiniões contrárias. Em verdade, são monólogos desconectados, e não debates democráticos.

Algumas das ideias propagadas se voltam contra a proteção de setores mais vulneráveis da sociedade, as denominadas minorias. Outras, contra direitos fundamentais, que levaram séculos para serem construídos.

Convém destacar que essa realidade não é inédita: ao contrário, é recorrente em épocas de crise, em que praticamente todas as opções apresentadas como salvadoras são admitidas por supostas maiorias, ainda que a qualquer custo.

Diante dessa constatação ao longo da história, as constituições democráticas trazem em seu bojo um conjunto de restrições para salvaguardar direitos e interesses especialmente relevantes, de modo que não haja perigo de que sejam eles extintos ou reduzidos. Eis a essência da proteção dos direitos fundamentais.

É necessário racionalizar esses debates, ter a consciência de que, quanto mais crítico o momento vivido, menos pertinente a adoção de mudanças substanciais no ordenamento jurídico – em especial, através de reformas constitucionais. Esse é, ademais, o primeiro sinal de respeito à ordem constitucional vigente, que não pode sofrer alterações a cada intempérie da sociedade.

Até o momento, a Constituição Federal de 1988 foi implementada de forma tímida, sendo certo que a efetivação da “Constituição Cidadã” ainda é uma promessa. Ao mesmo tempo, até a data de conclusão deste texto, a Constituição já havia passado por 87 emendas, em pouco mais de 26 anos de vigência! E, como é fácil constatar, tantas emendas não tornaram o país mais justo e igualitário, com mais educação, segurança, saúde, entre tantos outros direitos enunciados, mas ainda não conquistados de fato. Será esse, então, o caminho para construir o país que desejamos?


Luciana Vieira Dallaqua Vinci

Promotora de Justiça. Membro do Ministério Público Democrático. Mestranda em Direito pela PUC/SP.