“A corrupção, é fácil perceber, não pode ser extinta”
DIÁRIO DA MANHÃ

CARLOS FREITAS

Roberto Livianu, promotor de Justiça que, há anos, se dedica ao assunto como professor universitário e organizador de campanhas nacionais pela ética, estimulando a população a rejeitar a corrupção tem a seguinte opinião sobre o tema: “A corrupção, é fácil perceber, não pode ser extinta. Como não se pode extinguir a violência ou a desigualdade. Ela pode e deve ser controlada.”

Seu livro Corrupção e Direito Penal, de 2006, ganhou uma versão ampliada neste ano. A obra disseca a corrupção e os instrumentos para coibir essa prática.

“Jamais uma lei havia dotado de tanto poder os órgãos de controle interno no Brasil”, diz. Para o autor, a legislação tem conformação semelhante à Lei de Improbidade Administrativa e complementa a Lei de Licitações.

Livianu diz que os instrumentos disponíveis para combater a corrupção “são eficazes, desde que haja a possibilidade de concretização através dos organismos encarregados de sua aplicação”. Na realidade, é uma interrogação.

A Lei Anticorrupção valoriza o processo administrativo, que pode ser instaurado e julgado pela autoridade máxima dos Três Poderes. Mas, o caminho natural para o controle deverá ser a via judicial. Se a legislação for eficaz, novas demandas serão remetidas ao Judiciário, moroso e sobrecarregado.

“É uma lei penal travestida de lei civil e administrativa”, no dizer de Gilson Dipp, ministro recém-aposentado do Superior Tribunal de Justiça. Mentor das varas especializadas em julgar lavagem de dinheiro, Dipp não está no livro, mas analisou detidamente a novíssima lei. Algumas observações suas coincidem com o entendimento de Livianu.

Diz o autor: “A Lei 12.846/13, de caráter não penal, institui e regula a responsabilidade objetiva e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos de corrupção contra a administração pública nacional ou estrangeira.” A nova lei não exclui a responsabilidade individual de pessoas naturais, quer no plano civil quer no plano penal.

Entre juristas, há dúvidas sobre a possibilidade de penalizar criminalmente a pessoa jurídica. As punições expressivas da Lei Anticorrupção devem preocupar os empresários. A lei prevê multas de até 20% do faturamento, perda de bens, suspensão ou interdição parcial das atividades, proibição de receber incentivos e dissolução compulsória das empresas.

Cada órgão ou entidade pública poderá celebrar acordos de leniência, em que as empresas colaboram na identificação de envolvidos em irregularidades e obtenção de provas. “Talvez fosse mais interessante e apropriado que esta relação de colaboração fosse construída com o Ministério Público”, diz Livianu.

Para refrear a lavagem de dinheiro, há anos o Banco Central obriga os bancos a conhecer seus clientes (e os clientes de seus clientes).

EFEITOS

A Lei Anticorrupção estimula os programas de “compliance”, procedimentos de auditoria nas empresas para detectar fraudes e incentivar a denúncia de irregularidades, uma “tendência internacional no mundo empresarial”. Esse movimento global deu origem no Brasil a pactos empresariais pela ética e associações civis como o Instituto Ethos e o Instituto Etco, mencionados no livro.

Num País onde há “leis que não pegam”, a Lei Anticorrupção, mesmo ainda não regulamentada na esfera federal, ampliou o mercado para advogados e consultores em “compliance”. Livianu entende que “o Direito Penal, quando aplicado nos casos de corrupção, deve ser rigoroso, não dando margem à impunidade”. No livro, é nítida sua preferência pela adoção da pena “não como mero instrumento de punição, mas com fins de caráter preventivo.

Segundo o autor, o controle da corrupção exige planejamento estratégico e vontade política. Requer educação para a cidadania, mobilização da sociedade e eficiência do sistema de justiça. Ou seja, se a corrupção não pode ser extinta, ao menos que seja controlada e punida.