22 de outubro de 2018
Por Mário de Magalhães Papaterra Limongi
O eleitorado brasileiro optou, no primeiro turno, por dois candidatos que apresentam as maiores taxas de rejeição. O resultado contraria todos os cientistas políticos que sempre afirmaram que um candidato com alta taxa de rejeição não tem chance de se sair vencedor.
Trata-se de decisão soberana que a expressiva parcela do eleitorado derrotada deve respeitar, muito embora o primeiro colocado, curiosamente, seja o único a questionar a lisura do pleito, sugerindo fraude nas urnas eletrônicas.
Durante a campanha, os candidatos que disputarão o segundo turno (ou seus apoiadores) fizeram declarações firmes contra o espírito da Constituição que agora completa 30 anos.
Como é sabido, no programa do candidato Fernando Haddad, constava a proposta de convocar uma nova Constituinte, além de ideias que contemplavam controle da imprensa e restrições aos poderes do Ministério Público.
Já o candidato Jair Bolsonaro, que, ao longo de sua carreira política fez várias declarações contra a Constituição Federal por ser permissiva, chegando a homenagear no Plenário da Câmara notório torturador, sugeriu em entrevista que aumentaria o número de ministros do Supremo Tribunal Federal com a clara intenção de influenciar na corte que tem como principal atribuição interpretar a Carta Magna. Mais que isso, o candidato a vice, Hamilton Mourão, entre outras declarações, falou em uma “comissão de notáveis” para modificar a Constituição, com possível referendo popular, além de um “autogolpe” (seja lá, o que isso possa significar).
Pois bem.
Em suas primeiras declarações após a confirmação da realização do segundo turno das eleições presidenciais, os candidatos trataram de modificar o que haviam dito.
Haddad, em entrevista ao programa jornalístico de maior audiência da televisão brasileira, afirmou que seu partido reviu a proposta e que vai fazer as reformas por emenda constitucional. Na mesma entrevista, tratou de desautorizar a proposta do ex-ministro José Dirceu de “tomar o poder” (também aqui, seja lá o que isso possa significar).
Bolsonaro, por sua vez, no mesmo programa, foi mais contundente, afirmando textualmente que “vamos ser escravos de nossa Constituição”, além de, com veemência, ter desautorizado as declarações de seu vice, em especial sobre o chamado “autogolpe”.
A postura dos candidatos, os dois procurando agradar aos eleitores não representados, mostra a importância da existência de um segundo turno.
Certamente, se a eleição tivesse se encerrado no primeiro turno, o vencedor se sentiria legitimado, apesar de sua alta taxa de rejeição, a colocar em prática propostas com as quais a maioria da população não concorda.
A toda evidência, a nossa Constituição não é perfeita. No entanto, ao longo de seus 30 anos, tem sido criticada mais pelas suas virtudes do que por seus erros.
Apenas para citar um exemplo, não houvesse disposição constitucional a respeito da licença ambiental (não por acaso, muito criticada), nosso meio ambiente, já degradado, não resistiria.
Neste segundo turno, os eleitores que, como o signatário, escolheram candidatos que não obtiveram êxito eleitoral devem ficar atentos na defesa do espírito da nossa Lei Maior.
Mário de Magalhães Papaterra Limongi é procurador de Justiça e membro do MP Democrático.
Clique aqui e leia o original no Conjur.
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