Em agosto de 2020, no segundo ano do Governo Bolsonaro, seis meses após o início da pandemia, após ser anunciado o estapafúrdio lançamento da nota de 200, do lobo guará, o Instituto Não Aceito Corrupção, a Transparência Partidária e mais oito entidades assinaram manifesto pedindo que o Banco Central revise a posição, inclusive instaram três partidos políticos a judicializar o tema, o que aconteceu, chegando a questão ao STF, que não interrompeu o fluxo.

Segundo as organizações, a criação da nota beneficiaria apenas atividades criminosas, incluindo a corrupção. O grupo à época também pediu o fim da nota de R$ 100. “A criação da nota de R$ 200, portanto, beneficiaria indivíduos e organizações criminosas que movimentam grandes somas de dinheiro ilícito, diminuindo significativamente, portanto, a probabilidade de detecção de transações financeiras envolvidas em atividades como corrupção e os demais crimes do colarinho branco, além do tráfico de drogas, tráfico de armas, descaminho, contrabando, terrorismo, entre outras”

O grupo fez referência a pesquisas e levantamentos a respeito da relação entre a população brasileira e o dinheiro em papel. Um dos relatórios destacados — “O brasileiro e sua relação com o dinheiro” —, feito pelo Banco Central em 2018, aponta que 85% dos brasileiros portam menos do que R$ 100 em dinheiro vivo. Ainda, uma pesquisa conduzida pelo Plano CDE, entre 30 e 31 de julho, aponta que 60% dos entrevistados preferem notas menores que R$ 200 para saques, enquanto 76% acreditam que a nova cédula pode dificultar o troco. O levantamento à época entrevistou 1.000 pessoas, em 26 estados brasileiros, e tem margem de erro de 3,1%, com intervalo de confiança de 95%.

O grupo apontou como preocupante a maneira pouco transparente e pouco democrática como o processo de lançamento da nota ocorreu, enaltecendo que a nível mundial a tendência era exatamente a oposta, tendo o Banco Central Europeu retirado de circulação a nota de 500 euros, atento a todas as questões salientadas.

À época o Presidente do Banco Central respondeu à Ministra Carmen Lúcia que a emissão de notas de 200 era absolutamente imprescindível, questão de vida ou morte para o país. As entidades alertaram que a nota de 200 facilitaria a vida dos criminosos, inclusive dos assaltantes de bancos e carros fortes, incentivando este tipo de crime pela maior facilidade de transporte das notas em decorrência do peso menor.

Passados pouco mais de três anos da decisão sem transparência e na contramão do interesse público e em relação às tendências internacionais, de fato já em 2021 os assaltos a bancos e carros fortes tiveram significativo aumento mais de 10%.

Óbvio que no âmbito criminológico talvez haja uma multiplicidade de fatores que hipoteticamente explicariam tal cenário. Mas não se pode descartar a possibilidade de ter o lançamento da nova nota, que traria mais facilidade aos ladrões, ter sido um fator convidativo ao aumento destas cifras. Ou seja, a nova nota pode ter efetivamente afetado os números da criminalidade, conforme alertas reiterados feitos antes de seu lançamento, ainda que apenas parte das cédulas estejam. Em circulação vez que a percepção do assaltante é que no sentido de que a facilidade concretamente existe e isto é um fato que convida ao crime.

Passado esse longo período, a nota simplesmente não é vista, à exceção do rumoroso episódio da apreensão dos R$33.000,00 nas nádegas do Senador Chico Rodrigues (que não sofreu punição), onde havia várias delas. Ninguém a toca, ninguém a quer, pois, a circulação é difícil pela falta de troco. Houve um outro questionamento judicial feito pelos deficientes visuais, relacionado ao tamanho da cédula, o qual foi igualmente mal planejado, que dificultava seu manejo. De acordo com as estatísticas da autoridade monetária, apenas 132 milhões de cédulas de R$ 200 circulam hoje. Isso representa menos que a própria nota de R$ 1, aposentada em 2005.

Para compararmos, esse total é o equivalente a cerca de 14 vezes menos que as notas de R$ 50 e de R$ 100. Essas são as cédulas que mais circulam hoje. Ao todo, são 1,74 bilhão de notas de R$ 50 e 1,81 bilhão de notas de R$ 100 na praça.

Portanto, temos cerca de 318 milhões de cédulas (ou pouco mais de 70% do total) aguardando para entrar em circulação. Procurado pela Inteligência Financeira, o Banco Central afirma que a distribuição “vem evoluindo em linha com o esperado”.

Portanto, o pior, o mais grave de tudo está relacionado à perda crescente de segurança jurídica, de previsibilidade, de credibilidade das Instituições, num país em que mais um acordo de leniência, que havia sido homologado pelo STF acaba de ser anulado pelo próprio STF, neste caso envolvendo uma multa de quase 11 bilhões, beneficiando a J&F.

Retornando ao tema das cédulas, o Presidente do BACEN afirmou categoricamente em agosto de 2020, que a emissão de notas era essencial e aquela emissão seria urgente naquele momento para prover o meio circulante e facilitar o pagamento do auxílio emergencial, pois poderiam faltar cédulas na pandemia, não obstante todas as pesquisas que mostravam que o cenário era diametralmente o oposto. Mas, a verdade revelada é que, ao que tudo indica, o Brasil não precisava das novas notas, com o se alertou e elas contribuíram para aumento de índices de criminalidade de roubos a bancos e carros fortes e custaram caro aos cofres do país e obviamente a nota de 100, que não seria o ideal, resolveria as demandas. Novamente ficou na poeira, relegada ao nada a idéia da prevalência do interesse público.