18/11/2016
Estadão/Blog do Fausto Macedo
Uma nova visão no combate ao abuso de álcool e drogas

Mário Sérgio Sobrinho e Luís Roberto Jordão Wakim*
Neste dia 17 de novembro, o Ministério Público terá uma oportunidade ímpar de propugnar a importância de uma abordagem mais ampla, que ultrapasse a dimensão meramente repressiva, para a política de combate ao uso de drogas que ora se aplica no país. Neste dia, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) realizará audiência pública para debater de que maneira o conjunto de procuradores e promotores de todo o país pode atuar na reformulação da visão que se tem hoje, levando em conta os reflexos do consumo de psicotrópicos sobre a saúde da população e também sobre as taxas de encarceramento.

Uma constatação óbvia, mas nem por isso menos importante, é que o abuso em relação ao consumo de álcool e outras drogas não representa um tema prioritário no debate público nacional. Considerando-se o impacto que o uso de tais substâncias traz para os campos da saúde, educação, assistência social, cidadania, segurança, habitação e justiça, faz-se necessário dar à questão a relevância que ela merece.

O atual ato normativo que dá fundamentação legal ao Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas (Sisnad) é a Lei nº 11.343/06, que trata das ações de prevenção ao uso indevido, do tratamento e reinserção social, bem como estrutura o sistema repressivo nacional para coibir a produção e o tráfico ilícito, por meio de diversos tipos penais.

Uma década depois do surgimento dessa legislação, o que se nota é que várias das ações ali previstas não saíram do papel ou, se foram implementadas, isso ocorreu de forma tímida. Onde está o trabalho de prevenção do uso indevido, especialmente por parte de crianças e adolscentes, como estabelece o artigo 227, §3º, inciso VII da lei? E quanto ao tratamento de usuários e dependentes químicos, iniciativa que contribuiria firmemente para reduzir a demanda por drogas? Ações como essas teriam o condão de diminuir estigmatização dos usuários, especialmente em reação àqueles que enfrentam situação de com grave vulnerabilidade social.

Nesse período, a necessária repressão à produção e ao tráfico não foi acompanhada de políticas públicas e ações conjuntas das instituições e agentes envolvidos na complexa questão das drogas, ampliando o impacto da drogadicção na vida da população brasileira.

Atribui-se à atual lei, em razão do elevado número de pessoas presas pela prática de tráfico de drogas, responsabilidade pelo espantoso crescimento da população carcerária brasileira que ocupa hoje o quarto lugar em maior número de pessoas presas no mundo. Esse cenário poderia ser diferente se tivessem sido adotadas políticas continuadas de prevenção, tratamento e reinserção social.

Outro problema a enfrentar diz respeito à falta de articulação de ações intersetoriais para o tratamento ofertado pela rede de atenção psicossocial, infelizmente ainda pouco estruturada no território nacional – existem apenas 367 Centros de Atenção Psicossocial Álccol e Drogas (CAPS) no Brasil.

Urge disponibilizar ações de prevenção e tratamento diversificado ao cidadão fortemente alcançado pelo abuso do álcool e outras drogas e proporcionar apoio irrestrito às famílias dessas pessoas por meio de serviços ágeis, competentes e facilitadores da reinserção social e profissional de todos, sem perder de vista que semelhante cuidado deve ser oferecido ao infrator encarcerado que também seja abusador ou dependente dessas substâncias.
O Ministério Público brasileiro, sempre atento ao desenvolvimento das políticas públicas para que elas reflitam o que determina a lei, necessita entrar de corpo e alma nessa luta. Que o evento do dia 17 seja um marco nessa caminhada.

*MÁRIO SÉRGIO É INTEGRANTE DO MOVIMENTO MINISTÉRIO PÚBLICO DEMOCRÁTICO

*LUÍS WAKIM É PROMOTOR DE JUSTIÇA
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