Roberto Livianu, Valderez Deusdedit Abbud e Ricardo Prado Pires de Campos*
02 de outubro de 2022 | 05h00

Temos vivido dias de extrema tensão, chegando infelizmente às vias da violência política. Na democracia, a maioria escolhe quem nos representará. Mas a partir daí, o exercício do poder deve contemplar a todos, inclusive aqueles que não votaram no eleito, as minorias, os excluídos. Esta é a magia espetacular da democracia. O nós contra eles, a partir de 1º de janeiro de 2023 precisa ficar para trás.

Hoje, brasileiros e brasileiras decidem o destino da nação para os próximos quatro anos. As escolhas dos membros dos Parlamentos e dos Executivos que comandarão os Estados e a União têm, obviamente, forte impacto na vida das pessoas. Embora cada um de nós seja responsável por suas próprias vidas, é inegável que os rumos da sociedade interferem na vida de todos e todas.

A sociedade contemporânea tem aproximado as pessoas. As redes sociais permitem que alguém que não conhecemos participe de nossas vidas, para o bem ou para o mal. As formas de convivência se ampliam e isso amplifica a importância de uma vida social saudável, cordial e produtiva.

Há muito tempo, grupos humanos se reúnem para tomar decisões que impactam a coletividade. Com o crescimento da população, foi preciso criar instrumentos de consulta da vontade das pessoas. As eleições são mecanismos eficientes para ouvir e decidir o rumo da sociedade. Rousseau cunhou o termo soberania popular para exprimir essa vontade coletiva.

Esse processo é democrático, pois permite que cada um dê sua contribuição, expresse o seu voto e, assim, colabore nessa construção coletiva. Trabalhando conjuntamente construímos palácios, rodovias, hospitais e centros urbanos, desenvolvemos técnicas e tecnologias, criamos conhecimento e o transmitimos por gerações através das escolas e universidades. Individualmente somos pequenos, nossa capacidade produtiva é limitada, e se vivêssemos isoladamente, seguramente, teríamos apenas uma pequena fração dos serviços e dos bens que temos a nossa disposição na atualidade.

Viver em sociedade foi um grande ganho para todos nós; e precisa continuar. Participar dessa construção coletiva é ao mesmo tempo um direito e uma obrigação, pois somos beneficiários desses avanços, mas temos o dever de dar a nossa contribuição.

Nessas eleições, temos o direito de votar em candidatos a cada um dos cargos que serão preenchidos, mas temos o dever de respeitar o resultado das urnas, qualquer que seja ele. Conhecemos o caráter de alguém ao observar como lida com o sucesso e com o fracasso.

As democracias ainda que imperfeitas, são a melhor forma de governo dentre todas as que já foram experimentadas pela civilização. Embora tenhamos pessoas que ainda acreditem na violência como forma de gestão, que queiram se impor mesmo sem ter razão, o fato é que a sociedade contemporânea cada vez mais deixa de tolerar comportamentos golpistas.

No mundo civilizado, as disputas e desavenças são resolvidas pela concorrência regrada, pelo diálogo ou pela mediação, com respeito às regras do jogo pré-estabelecidas. As leis fixam o procedimento a seguir e os juízes e o sistema de Justiça se encarregam de aplicar aos casos concretos a vontade abstrata das leis.

A Justiça Eleitoral, que acaba de completar um ciclo de vida de noventa anos no Brasil, é responsável por organizar, realizar e proclamar o resultado das eleições. Tem a missão de coibir os abusos de poder político e econômico, de evitar a disseminação de fakenews.

Aos candidatos cabe realizar suas campanhas dentro das regras do jogo e, se eleitos, governar. Se não eleitos, devem respeitar o resultado das urnas. E, se for o caso, se prepararem para a próxima eleição. A vantagem da Democracia é que o poder está periodicamente em disputa e pode ser pleiteado por novos candidatos a cada período eleitoral.

As urnas eletrônicas, realidade no Brasil desde 1996, são seguras e confiáveis, e sua utilização foi chancelada democraticamente pelo Congresso. Nada mais são que o uso da tecnologia que nos permite registrar dados, efetuar cálculos e transmiti-los, atividades que as calculadoras e os computadores realizam diariamente para todos nós.

Não há nenhum segredo nessa prática. E tudo é feito sob os olhares dos fiscais dos partidos, do Ministério Público, da imprensa, de comissões internacionais e da própria sociedade. Não há caixa preta. O resultado não é decorrência da vontade dos ministros do TSE, pois não são eles que colhem, nem apuram os votos. Isso é feito em cada cidade pela Justiça Eleitoral local. E cada urna, ao final da votação, gera um boletim do resultado, os quais somados no país inteiro irão produzir os resultados (somados eletronicamente para evitar a parcialidade humana).

Portanto, o resultado das urnas deve ser simplesmente a soma das vontades de cada eleitor, sendo elementar que quem vencer deve levar e quem for derrotado deve se render. Soberania popular é a base essencial da democracia e a partir das 17h ela mais uma vez deve imperar hoje.

*Roberto Livianu, Valderez Deusdedit Abbud e Ricardo Prado Pires de Campos são procuradores de Justiça e membros da diretoria do MPD – Movimento do Ministério Público Democrático