Debate em SP ocorreu no dia em que o G1 mostrou que 64% dos casos de morte violentas detectados pelo monitor da violência continuam em aberto

Por Cíntia Acayaba, G1 São Paulo

09/11/2017 14h35  Atualizado há 42 minutos

Mais de 60% dos casos de homicídio e latrocínio seguem sem conclusão

Representantes do Ministério Público, Polícia Civil, Militar e do Núcleo de Estudos de Violência (NEV) da USP pediram na manhã desta quinta-feira (9), em São Paulo, mais investimento para os setores de inteligência e tecnologia para solucionar assassinatos no país. O Brasil é recordista no número de homicídios em números absolutos.

As propostas apresentadas serão encaminhadas ao Conselho Nacional de Justiça, ao Conselho Nacional do Ministério Público, a procuradores federais, ao Congresso Nacional e cúpulas policiais.

O debate promovido pelo Movimento do Ministério Público Democrático (MPD): “homicídios e latrocínios, soluções para combater a impunidade” ocorreu no dia em que o G1 publicou levantamento sobre as investigações de mortes violentas ocorridas entre 21 e 27 de agosto e registradas pelo Monitor da Violência, projeto do G1 com o NEV e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Dois meses e meio depois, 64% do total de casos de morte violenta ocorridos no período no Brasil continuam em aberto e só 12% registram alguma prisão. Se forem excluídos os casos em que a polícia não informa ou que não foi possível obter o status dos crimes, o índice de casos em andamento sobe para 75% (e o de prisões, para 15%).

Promotor Arual Martins, do Tribunal do júri, delegada Elisabete Sato, diretora do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) e coronel Francisco Cangerana Neto, comandante do Policiamento na área Central da cidade de SP (Foto: Cíntia Acayaba/G1)

Segundo o promotor Arual Martins, do 3º Tribunal do Júri de São Paulo, “as investigações dos homicídios são como uma linha de produção em que cada atividade _polícia, Ministério Público e Judiciário_ sempre vai interferir na outra”. Para ele, é preciso que cada área atue com efetividade.

“Como promotores, vamos trabalhar e buscar a apuração. Buscamos a efetividade da apuração criminal”, disse. O bom resultado de uma investigação, de acordo com Martins, é quando se vai além da testemunha. “Temos a lei do silêncio, a lei da omissão. A apuração criminal não é fácil. Temos que trabalhar com outros mecanismos que não dependem da prova testemunhal. É trabalho técnico, de apuração”, afirma.

Para o promotor, os jurados dos crimes de homicídios estão cada vez mais querendo ver tecnologia na argumentação da defesa e da acusação. “A maioria dos jurados dos tribunais do júri do Fórum da Barra Funda são do centro expandido da capital paulista. Então, temos um perfil de jurados muito esclarecido, que assiste Netflix, e que exige provas e tecnologias como apresentadas nas séries de investigações criminais”.

“Precisamos investir na tecnologia da apuração criminal. Não basta mais só giz, lousa e saliva”, completa. O promotor menciona que ainda em 2017 fotos de cenas de crime são enviadas em preto e branco porque não havia tinta colorida na impressora.

Além da tecnologia, Martins acredita que é preciso de um protocolo de preservação da cena do crime estabelecido entre Polícia Civil e Militar.

A diretora do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de São Paulo, Elisabeth Sato, afirmou que não está satisfeita com o índice de esclarecimentos dos homicídios: 41,33% até setembro. Para ela, no entanto, não é possível culpar só a polícia. “A polícia é muito valorosa, fazem o impossível. Precisamos adquirir mais equipamentos e ter recursos mais efetivos.

Delegada Elisabete Sato e demais delegados participam de debate sobre violência em SP (Foto: Cíntia Acayaba/G1)

De acordo com Sato, da média de 600 homicídios que ocorrem na França, 80% são esclarecidos, quase todos por meio de DNA. Questionada sobre as estatísticas do uso da técnica no Brasil e em São Paulo para solução de homicídios, Sato disse que não há levantamento e quase sempre é utilizada em casos de grande repercussão.

O comandante do policiamento da área central da cidade de São Paulo, Francisco Alves Cangerana Neto, falou sobre o trabalho de prevenção da Polícia Militar em assassinatos. Cangerana Neto mencionou um programa para recolher armas brancas no Centro da capital paulista e, com isso, coibir o número de homicídios.

Ele também menciona a necessidade de o patrulheiro preservar a cena do crime para que as investigações transcorram com resultados mais efetivos.

Bruno Paes Manso, do NEV, também fala sobre a necessidade de maiores investimentos nas polícias para que se garanta que “grupos armados não imponham a tirania nos bairros”. “O Estado não pode deixar que isso aconteça. É fundamental que se garanta isso. Inclusive que os parentes das vítimas possam chorar porque muitos não choram para não morrer. Isso é uma coisa muito trágica”, diz.

Bruno Paes Manso apresenta dados de entidade sobre violência (Foto: Cíntia Acayaba/G1)

Paes Manso diz ainda sobre a necessidade de MP, PM e Polícia Civil mapearem as redes de conflito nos bairros: “poucos grupos matam muito”, diz ele.

Como proposta de prevenir crimes e, com isso, diminuir o número de investigações, o especialista fala sobre a relação de homicídios com o tráfico “O tráfico de drogas sem violência é tolerável. Nos Estados Unidos, por exemplo, se permitiu a venda de drogas por BIP e celular, o que evitava conflitos”, afirma.

Para Paes Manso, também é preciso pensar nas prisões. “A prisão acaba fortalecendo as facções. Até que ponto vamos encher as prisões? Qual a estratégia a ser pensada?”, questiona.

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