Durante os quase quatro anos de governo Bolsonaro três instituições- a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e o Supremo Tribunal Federal- ganharam destaques, que, certamente, seus membros dispensam.
A Polícia Federal foi a principal causa da saída do então todo poderoso ministro da Justiça, Sérgio Moro.
Para surpresa de alguns, o juiz Sérgio Moro, alçado à condição de herói nacional por sua atuação na Operação Lava Jato, aceitou o cargo de ministro da Justiça, abandonando a magistratura (pessoalmente, jamais imaginei que o protagonista de uma ação que mudou a história política do Brasil, fosse se deixar seduzir por um convite por alguém que, claramente, foi beneficiado pela sua atuação, ainda que não fosse essa sua intenção).
Em pouco tempo, como sempre me pareceu óbvio, Moro e Bolsonaro se desentenderam e a principal razão foi a atuação da Polícia Federal. Em tumultuada e nada republicana reunião ministerial, tornada pública por decisão do então decano do Supremo Tribunal Federal, Celso de Melo (a mesma reunião em que o titular da pasta do Meio Ambiente sugeriu aproveitar a atenção dada pela imprensa à pandemia “para passar a boiada”), Bolsonaro cobrou de seu Ministro da Justiça um relatório diário da Polícia Federal, para, no seu dizer “bem decidir o futuro dessa nação”.
O que restou evidente é que Bolsonaro, longe de se preocupar com o interesse público, queria um chefe da Polícia Federal submisso em razão das investigações feitas para a apuração do escândalo das rachadinhas com possível envolvimento de seu filho.
Com a mudança no Ministério da Justiça, tornaram-se frequentes as mudanças nas chefias da Polícia Federal, todas elas sem transparência e que motivam descontentamento, ainda que velado, nos membros da Polícia Federal.
Como é sabido, os policiais federais, por sua atuação profissional e independente, vinham adquirindo merecido prestígio, o que, inclusive, facilitava reinvindicações salariais e de melhoria de condições de trabalho.
Curioso notar que governo que se elegeu fazendo o discurso de que iria prestigiar a polícia, tratou de deixá-la, ao menos para os olhares externos, como órgão dependente do governo.
Inegavelmente se formos comparar o prestígio de que gozava a Polícia Federal quatro anos atrás, houve decréscimo.
A crítica feita acima não se dirige aos membros da Polícia Federal, mas ao governo que sempre que possível faz questão de demonstrar que tem controle sobre a chefia da instituição (ainda que isto seja uma mera bravata).
Da mesma forma, o Ministério Público Federal, nos últimos anos, não é mais visto como órgão independente, guardião da democracia, para ser apontado como aliado do governo Bolsonaro.
Tudo começou com o abandono de uma tradição com a nomeação para o cargo de Procurador Geral da República de pessoa que sequer participou da escolha interna, representada por uma lista tríplice.
É sabido que a lista tríplice para a escolha do procurador-geral da República não tem previsão legal, ao contrário do que ocorre para a escolha dos Procuradores Gerais dos Ministérios Públicos Estaduais.
Ainda assim, considerando que a escolha final é do Chefe do Executivo, após passagem pelo Senado Federal, o sistema de lista tríplice constitui uma forma de prestigiar a instituição sem, necessariamente, curvar-se a ela.
O fato é que durante todo o período de seus mandatos não se conhece uma única posição do Procurador Geral da República Augusto Aras “que tenha desagradado o Planalto”, como gostam de dizer os analistas políticos.
Também aqui, justa ou injustamente, a perda de prestígio do Ministério Público, é evidente.
Se é certo que se pode apontar, aqui ou ali, exageros na atuação de alguns Procuradores da República, inquestionável que a conduta, vista como independente nos últimos anos, é melhor que a conduta vista como omissa e dependente.
Se, de um lado, a Polícia Federal e o Ministério Público, ressalvado o empenho e dedicação da esmagadora maioria de seus membros, perderam o prestígio e o respeito duramente conquistados ao longo dos anos, o Supremo Tribunal Federal passou a ser visto como inimigo do governo.
A propósito, o Presidente Bolsonaro não perde oportunidade para, publicamente, criticar membros do Supremo Tribunal Federal, chegando a dizer, sem nenhuma discrição, que conta com apenas dois aliados- os ministros por ele nomeados- e que, caso reeleito, poderá “enquadrar o Supremo” além de nomear mais aliados.
A falta de respeito à autonomia dos poderes já sequer envergonha e é explícita.
Como já salientei em artigo anterior nesse espaço, a escolha a ser feita na eleição presidencial que se aproxima tem como consequência o tratamento a ser dado pelo Chefe do Executivo às diversas instituições.
A Polícia Federal e o Ministério Público não podem ser vistos pelo futuro presidente da República como órgão auxiliar, assim como não se pode atacar a independência do Supremo Tribunal Federal.
Com a palavra, o eleitor.
* Mário de Magalhães Papaterra Limongi é procurador de Justiça e diretor do Ministério Público Democrático (MPD).
Deixar um comentário