Poucas instituições brasileiras estiveram tão na berlinda nos últimos anos quanto o Ministério Público, especialmente seu ramo federal. Em primeiro lugar, por causa da operação “Lava-Jato”, que testou os limites da formação das forças-tarefa, da exposição à mídia e das pretensões, quase jacobinas, de purificar o ambiente político do país. Este é um papel que – desde logo dizemos – não cabe à instituição, mas à própria sociedade brasileira, a ser alcançado pelo único método admissível: a eleição de representantes.
Os órgãos ministeriais têm todo o direito de participar do debate público, de fazer sugestões e críticas, mas brados nas mídias sociais não alteram o desfecho de processos. Uma vez formada a coisa julgada, ainda que muito se discorde da decisão, cabe reconhecer que o caso chegou ao fim.
A Lava-Jato obteve conquistas importantes, mas os exageros ajudaram a deslegitimá-la.
Por outro lado, causa espécie a possibilidade de um Ministério Público conformado e complacente, contentando-se em dar pareceres na atuação de outros, sem se valer de seus poderes de investigação cível, criminal e eleitoral, assistindo inerte direitos indisponíveis da cidadania serem lesados.
Investigar e processar malfeitos, abusos, desvios de recursos e de finalidade, ataques à democracia, crimes de ação penal pública, ofensas ao meio ambiente e aos povos indígenas, atos de improbidade administrativa e ilícitos eleitorais, sempre com respeito ao devido processo legal: para isto foi desenhado o Ministério Público. Não importa e não pode importar se tais condutas foram praticadas por “A”, “B” ou “C” ou se os perpetradores ocupam altos cargos na administração pública, se não o maior. A complacência ministerial abre espaços para que outros agentes e instituições, mal posicionados no sistema acusatório ou sem as mesmas garantias constitucionais, lhe façam as vezes.
Nos últimos quatro anos o país assistiu a um sistemático ataque à democracia e às suas instituições por parte do ex-Presidente da República, sendo que o órgão com competência constitucional para defesa do regime democrático, na visão de inúmeros setores sociais, não atuou a contento. A interpretação de que se tratava de liberdade de expressão ou de atuação política não levou em conta o marcado uso da máquina pública.
A verdade factual importa e sua desdita tem consequências. Além disso, cada centavo de gasto público se origina dos esforços dos cidadãos.
A falta de previsão constitucional ou legal de formação de uma lista tríplice para os candidatos a Procurador-Geral da República contribui para este estado de coisas. Seria um contrapeso útil para mitigar a realidade de que o Procurador-Geral é o único órgão que pode processar criminalmente o Presidente da República – que o escolhe – e é sabatinado por Senadores – que só podem ser processados por ele.
Outra omissão normativa, que dá ao PGR poderes de vulto, é a impossibilidade de revisão institucional de seus arquivamentos e eventuais demoras. Que tal se esta função fosse atribuída ao Conselho Superior do Ministério Público, exigindo-se maioria qualificada?
Não combina com a Constituição Republicana a existência de poderes sem controle.
O Brasil, país injusto e desigual, precisa de um Ministério Público atuante, sem exageros, nem complacências.
*Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, procurador regional da República
*Pedro Barbosa Pereira Neto, procurador regional da República e membro da Diretoria do MPD – Movimento do Ministério Público Democrático
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